Neurociência da frustração em tempos digitais

Neurociência da frustração em tempos digitais

Por Adriana Fóz

 

Vivemos tempos digitais muito vulneráveis aos sentimentos frustrantes, às intolerâncias, ansiedades, e a internet tem estreita relação com os estados emocionais, tão desagradáveis. A queda de conexão, a lentidão da conexão wi-fi, etc., são fatores que vulnerabilizam os indivíduos ultimamente. As redes sociais também predispõem àqueles estados emocionais e acabam por encorajar pessoas com posições extremistas a se sentirem mais seguras e confiantes para expressá-las. Sem se importar com o outro, muitas pessoas que sentem impotência ou frustrações se comportam desta maneira, escondendo suas fraquezas e consciências. Colocam-se como se tivessem mais poder, e empoderadas, diminuem, ofendendo o outro.

A impotência, o sentimento de frustração e o não desenvolvimento de estratégias para lidar com tais situações, pois não fomos alfabetizados formalmente para se frustrar. Além, da necessidade que algumas pessoas têm de se impor sobre outras pessoas, levam a polarizações e extremismos em todo o mundo. Nas redes sociais isto se explicita cada vez mais e a psicóloga americana Pamela Rutledge1, diretora do Media Psychology Research Center (Centro de Pesquisas sobre Psicologia e Mídia), na Califórnia, faz importantes estudos sobre as redes sociais e o comportamento. Mas não é somente nas redes sociais que percebemos a intolerância e as polarizações, pois podemos testemunhar nas escolas, no relacionamento afetivo, no trânsito, no supermercado e assim por diante.

Portanto, nos dedicarmos ao tema da frustração é de grande valia para a saúde emocional e mental dos indivíduos. A frustração acontece quando não alcançamos objetivos, quando as expectativas são inatingidas, quando não realizamos desejos, sonhos ou projetos. É resultado de um processo cerebral que acontece para nos preparar para a realização de um ato, tem uma função “proativa” para o comportamento humano. Traz o incomodo que pode impulsionar uma ação.

Os estudos e pesquisas das neurociências têm avançado muito nos últimos anos, mas os conhecimentos das redes da frustração ainda engatinham. Apesar do incomodo da frustração ser tão antigo quanto sentir desejo, o aumento dos estudos de neuroimagem focados nesse estado emocional são mais recentes.

O circuito da raiva, já mais estabelecidos do ponto de vista das pesquisas robustas, é bastante similar ao da frustração, porém não é o mesmo. No entanto, a motivação e o sistema de recompensas do cérebro estão intimamente ligados ao circuito frustrante.

A neurociência já tem uma boa noção do que acontece quando estamos empolgados em buscar uma “recompensa”. Os circuitos de recompensa são bastante correlacionados ao neurotransmissor dopamina, que tem levado a fama de neurotransmissor do prazer, mas estudos recentes têm mostrado que atuam muito mais na motivação. O neurotransmissor dopamina inunda as vias neurais nos caminhos pela busca do desejo, caminhos que nos leva adiante. E não é exagero dizer que o motivo da busca do cérebro humano, é ser inundado por este bálsamo neural.

Segundo recente publicação do pesquisador Kyle E. Parker e colaboradores  o cérebro é um instrumento voltado para o equilíbrio e, de acordo com suas pesquisas, os mamíferos têm outro sistema que exerce uma força contrária sobre o aumento da recompensa, chamado sistema modulador da nocicepção (que também é a chave para a maneira como o cérebro modula a dor). Os neurônios deste sistema (apelidados de “neurônios de frustração”) emitem moléculas chamadas nociceptina que suprimem a dopamina. Logo, a nociceptina é anti-dopamina.

Os pesquisadores descobriram como isso funciona observando ratos à procura de açúcar escondido. Para obter o açúcar, eles tiveram que se esforçar, cutucar o focinho e lamber. Facilitaram, a princípio, para que tivessem motivação visando obter o açúcar, mas a cada tentativa eles passaram a dificultar um pouco mais o sucesso dos ratos. Depois de muito dificultar, os ratos cutucavam o focinho repetidamente e como ainda não conseguiam provar o doce, finalmente começaram a desistir. Eventualmente, todos eles pararam de tentar.

Enquanto isso acontecia, os pesquisadores rastreavam a atividade neural dos roedores e descobriram que os neurônios da nociceptina eram mais ativos quando os ratos desistiam. Mas vejam que interessante, esses neurônios ficam localizados perto da área tegmentar ventral do cérebro (ATV), o centro de atividades no sistema de recompensa! Por enquanto, o valor da descoberta poderia ser mais direto – simplesmente saber que “desistir” depois de se esforçar não é uma falha de caráter ou falha moral, é apenas outra maneira de o cérebro manter as coisas niveladas ou equilibradas.

A razão dessa interação entre aumento de recompensa e supressão de recompensa se resume à tendência do cérebro em direção à estabilidade e ao equilíbrio, conforme mencionado acima. É também conhecido como homeostase. Os cérebros dos mamíferos têm mecanismos inerentes para impedir que a busca por recompensas vá longe demais em qualquer direção. Na natureza, a continuação de um comportamento arriscado em busca de recompensas quando o sucesso está fora de alcance pode resultar em ferimentos ou morte, portanto, provavelmente herdamos esse ato de equilíbrio químico como um mecanismo de defesa, sobrevivência, uma estratégia altamente evoluída.

Imaginem a importância destes trabalhos! Distúrbios como depressão e dependência podem se desenvolver a partir desses sistemas regulatórios, ou de busca pela homeostase que não funcionariam bem por inúmeras razões.

“Podemos pensar em diferentes cenários onde as pessoas não são motivadas assim como a depressão e bloqueiam esses neurônios e receptores para ajudá-las a se sentirem melhor”, disse o autor sênior do estudo, Michael Bruchas2, cujo laboratório faz parte do  Washington University Pain Center, um centro multidisciplinar sediado no departamento de anestesiologia e psiquiatria, faz parte do EUREKA, um dos programas do National Institute of Health(NIH) .

Os pesquisadores pontuam que doenças neuropsiquiátricas que afetam a motivação podem ser melhoradas e que outros estudos em futuro recente podem esclarecer ainda mais esses e outros distúrbios, além de levar ao desenvolvimento de novas intervenções químicas para ajudar a restaurar o equilíbrio cerebral. É um ponto de luz para uma grande jornada, mas já é muito promissor, no meu entender.

Outro estudo bastante interessante que traz luz aos recém batizados neurônios da frustração- segundo o maior estudo com neuroimagem sobre frustração da atualidade-, é o do Rongjun Yu e colaboradores3, no qual verifica-se o circuito da frustração: amígdala, cinza periaqueductal (PAG), ínsula e córtex pré-frontal. Suas descobertas sugerem que a frustração pode ter uma função energizante. Como se a motivação que não aconteceu transforma-se em surtos (reações rápidas) agressivos, por meio de uma rede cortical, amígdala e PAG.

Ninguém gosta desta sensação e tampouco de não atingir objetivos ou alcançar expectativas, mas já que fazem parte da normalidade do cérebro humano, nos resta aprender mais sobre suas redes ou simplesmente treinar competências para superá-la4, concorda?

Quer saber mais sobre o assunto? Entre em contato conosco!

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

1- RUTLEDGE, P. ‘Impotentes e frustrados’ são os mais agressivos na internet, diz psicóloga. BBC News Brasil, 2015. https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150831_salasocial_agressividade_internet_rs acesso em: fev/20

2- BPARKER E., Kyle et al. A Paranigral VTA Nociceptin Circuit that Constrains Motivation for Reward. Cell.com,2019.

Crossref DOI link: https://doi.org/10.1016/J.CELL.2019.06.034. Acesso em: fev/20

3-YU,R e cols. The neural signature of escalating frustration in humans. sciencedirect.com, 2014. volume 54, 2014, pags 165-178. https://doi.org/10.1016/j.cortex.2014.02.013. Acesso em> fev/20

4- Fóz, A. Frustração. São Paulo: Benvirá, 2019.

 

 

Frustrado, eu?

Frustrado, eu?

Em novo livro, Adriana Fóz traz dicas de como melhor lidar com este sentimento

por Gisele Bortoleto, Diário da Região de São José do Rio Preto – Revista Bem-Estar

 

Você quer comprar uma casa, mas não tem dinheiro suficiente? Se sente insatisfeito e pouco valorizado em seu trabalho e esperou muito por uma promoção que não veio? Que atire a primeira pedra quem já não se sentiu frustrado. A verdade é que problemas, insatisfações ou não atingir metas acontecem com qualquer um. Você não está sozinho nessa.

Não importa a situação – corriqueira ou extraordinária -, praticamente não há um dia em que não nos defrontemos com situações que podem gerar frustração. Esse sentimento é quase intrínseco à condição do ser humano, sobretudo do homem contemporâneo.

E ensinar a entender que a grande questão é como lidamos com as frustrações que aparecem na nossa vida e, o mais importante, encontrar caminhos para a superação é a proposta do novo livro da psicopedagoga e neurocientista Adriana Fóz “Frustração – Como treinar suas competências emocionais para enfrentar os desafios da vida pessoal e profissional”, lançado pela editora Benvirá.

Frustração, diz Adriana, é o sentimento que nos acomete quando não conseguimos realizar um desejo, uma vontade ou uma necessidade. É a reação a uma expectativa não correspondida. “É uma sensação, um pensamento, um estado interior que reflete a não conquista. É quando nos sentimos mal por não ter alcançado algo em que colocamos algum empenho ou que fazia parte do que entendíamos como natural”, afirma.

Tem coisas e situações que nos pegam de surpresa, desprevenidos, causando mais do que simplesmente uma decepção. Repare que a frustração tem a ver com o que esperamos das pessoas e das situações – consciente ou inconscientemente. “Mas a verdade é que somos nós quem criamos as expectativas e, quando elas não são alcançadas, ganhamos esse ‘brinde'”, explica. Como enfrentamos e nos construímos e reconstruímos a partir desse sentimento ou dos nossos problemas e desafios é o que faz a diferença.

“Um dos caminhos para lidar com a frustração é reconfigurar nossas emoções – capacidade que todos nós temos, e podemos fazer isso através do treino de nossas competências emocionais”, diz Adriana. Esse treino foi batizado por ela de plasticidade emocional. Sobre esse assunto, Adriana Fóz falou com exclusividade com a revista Bem-Estar.

Revista Bem-Estar- Muitas pessoas não conseguem lidar com a frustração quando algo sai do roteiro ou são contrariadas. Por que tanta dificuldade?

Adriana Fóz- A infância é a época da gente treinar nosso autocontrole e a capacidade que a gente tem de se autorregular. As famílias e as escolas não estão dando muito espaço para as crianças errarem, se frustrarem. Os pais fazem tudo para que eles se frustrem o mínimo possível, sem saber que a frustração é o que vai fazer com que elas se tornem mais fortes e competentes para a vida. Tem caminhos que só nós podemos percorrer e a frustração é um deles. Quando a gente supera a frustração é quando nos sentimos fortes e conquistamos a autoestima que é a base de toda a competência.

Bem-Estar- E como é o adulto que não aprendeu a lidar com a frustração?

Adriana- Acaba se tornando um adulto impaciente, desfocado, que acha que tudo tem de ser feito da forma que ele quer e que o mundo está errado. Nunca acha que tem a responsabilidade e que a culpa é sempre do outro ou do mundo.

Bem-Estar- Onde vamos parar se tivermos um mundo repleto de pessoas que não sabem lidar com a frustração?

Adriana- Teremos uma sociedade adoecida das emoções que é o que já acontece. A depressão é a doença que mais acomete o mundo inteiro, o Brasil ocupa a primeira posição em número de pessoas ansiosas. Os problemas afetivos estão afetando o bem-estar, a saúde integral e física. A cada dia mais temos doenças provocadas pelas emoções.

Bem-Estar- E temos solução enquanto sociedade?

Adriana- Acho que o caminho é o da conexão do seu coração com o do outro. Acho que as pessoas não vão conseguir sozinhas. Vamos ter de procurar um pouco mais a verdade dos nossos objetivos, dos nossos sentimentos e essa nossa verdade terá de ter ressonância com a verdade do outro. Isso é conexão. Estamos conectados por fios, mas não pelos corações, não nas intenções, não nos sentimentos e é isso o que está adoecendo o ser humano, porque ele necessita do outro. Somos indivíduos, mas temos de ver que fazemos parte de um todo. Só dessa forma vamos nos curar e curar a sociedade.

Raio-X

Adriana Fóz

Pós-graduada em psicologia da educação pela Universidade de São Paulo (USP), é especialista em psicopedagogia e neuropsicologia. É diretora da NeuroConecte, pesquisadora do LINC (Laboratório de Neurociências Clínicas – Unifesp) e mestre em psicologia médica e psiquiatria pela mesma universidade. Referência nacional em educação socioemocional, reabilitação cognitiva e neurociência educacional, Adriana atende em seu consultório pacientes jovens e adultos, além de dar cursos e aulas em importantes instituições.

Dá pra prevenir

  1. Identifique uma situação com potencial frustrante;
  2. Sinta e pense, concentre-se na situação eem seus detalhes. Visualize;
  3. Racionalize e reflita em prol de ser assertivo;
  4. Crie e teste estratégias para passar pela situação com potencial frustrante;
  5. Caso a situação envolva outra pessoa, comunique-se da melhor forma possível. Deixe muito claro o que pensa ou espera. Busque, ao mesmo tempo, compreender o que a outra pessoa sente, pensa e entende sobre o mesmo assunto;
  6. Escolha, decida o caminho a seguir;
  7. Tenha um plano B, caso sua primeira escolha não atinja o resultado esperado.

Competências transformadoras

  • Perseverança
  • Empatia
  • Intuição
  • Resiliência
  • Gentileza/autocuidado
  • Generosidade
  • Paciência
  • Otimismo
  • Criatividade
  • Foco
  • Coragem
  • Perdão
  • Gratidão

 

P.S. Matéria publicada originalmente no site

https://www.diariodaregiao.com.br/_conteudo/2019/08/vida_e_estilo/comportamento/1162214-frustrado-eu.html

Frustrar-se faz parte!

Frustrar-se faz parte!

Por Adriana Fóz

 

Atualmente é notório a necessidade de nos atentarmos para os aspectos da saúde mental infantojuvenil. Por um lado a preocupação dos pais, a negligência ou superproteção de outros;  os problemas de comportamento, os desafios vivenciados pelas escolas e o sofrimento.

O mundo está mudando mais rápido do que nossos cérebros estão acostumados a processar. Enquanto seres humanos temos um processo inerente de maturação de funções e áreas cerebrais que amadurecem em parte com o passar do tempo, em parte pelos estímulos do ambiente.

A criança tem períodos sensíveis para o aprendizado os quais precisam ser estimulados e treinados. Habilidades como controle dos impulsos e tolerância às frustrações são importantíssimas para o amadurecimento de áreas cerebrais, tal como o pré-frontal, que é a ultima região a ser desenvolvida e tem um papel crucial para a tomada de decisões, atenção dividida e autocontrole emocional, por exemplo. Aquelas necessitam de oportunidades para desenvolver recursos de autoconhecimento, autogestão e controle de seus impulsos.

É vivenciando experiências e tolerando as inevitáveis frustrações que estes cérebros serão capazes de se fortalecerem e tornarem sujeitos autônomos, resilientes e pacientes. Treinar competências emocionais para esperar sua vez para falar, para esperarem a hora de comer um doce, para terminar uma atividade que iniciou, para fazer uma tarefa necessária, porém não tão interessantes aos mesmos. Dizer um “não” com amor e responsabilidade, exigir comportamentos empáticos, gentis e perseverantes, oportunizar experiências ricas e coerentes de aprendizado são muito relevantes para o treino de habilidades e desenvolvimento de competências necessárias na escola e na vida.

Ao contrário do que alguns podem pensar, a frustração é um estado emocional genuinamente humano e não um sentimento de fracos. Aliás, pelo contrário, vivenciar frustrações pode fazer o jovem mais forte e capaz. A frustração como mecanismo cerebral precisa ser mais estudada, uma vez que muito de suas redes neurais estão sendo ainda pesquisadas e reconhecidas. Porém, fato é que se trata de um mecanismo neurocognitivo inerente aos seres humanos. Talvez o circuito neural da frustração tenha sido criado para os homens irem atrás de seus objetivos e desejos. Isso porque se o individuo ficasse sempre satisfeito, não sentisse o desprazer, o incômodo, talvez não fosse se mobilizar para procurar o novo, se esforçar para alcançar metas e outras necessidades em prol da evolução. Mas deixaremos as causas para etologistas e neurocientistas. Aqui vamos tratar do porque recentemente as crianças ditas digitais têm tanta dificuldade em acatar limites, modificar comportamentos e tolerar frustrações. A professora de psicologia da UFPR, Lídia Weber discorreu sobre a relação dos pais com a imposição de regras as crianças alegando que ”cerca de 35% deles é negligente, ou seja, não impõe regras, nem dá afeto, e são essas as crianças que vão ‘dar problema’”, explica a professora e pesquisadora na área.

Se perguntar para um pai ou uma mãe: Você quer que seu filho se torne maduro, autônomo e independente? Quer ainda que seja automotivado, feliz e satisfeito com sua vida? Se a resposta for sim, não haverá outro jeito para alcançar seus objetivos paternais e maternais, do que ajudá-lo a superar frustrações. Desde já afirmo que ajudar não é fazer por, comprar o objeto de desejo ou terceirizar responsabilidades. Uma criança que é o centro das atenções de um lar, que pode tudo o que quer ou que tem sempre um dos pais a protegê-la de seus erros, ataca quem o critica ou a seu filho e sofre mais do que seu próprio filho pelos seus irremediáveis desacertos e esforços, tem muita chance de não alcançar o desejo acima colocado.

Nunca tivemos tantas crianças medicadas, tantos adolescentes deprimidos – inclusive os que chegam até o suicídio – e tantos jovens adultos infelizes. O que os pais e adultos não estão compreendendo? O que não conseguem ver? Sim, é a nossa geração adulta que está criando seus filhos delegando tarefas de diversão, uso do tempo, e condição de afeto, inconscientemente ou não, para tablets, celulares, produtos de satisfações imediatistas e desejos efêmeros. Sim, são os pais das atuais crianças e adolescentes que estão  grudados em seus smathphones, que acompanham a vida de outros “amigos”, que curtem o tempo todo o que pode ser apenas fake. Porém o não é fake, mas fato é que seus filhos são de verdade e crescem, desenvolvem e amadurecem seus cérebros, organismos os quais ainda não estão prontos para o discernimento, para tamanha responsabilidade que é o que vou fazer com meu presente. Sim, não falo do presente em dólar ou em reais, mas do presente do hoje, do tempo que uma vez perdido não volta nunca mais. Isto não será frustração, isso é arrependimento, culpa, ou outros sentimentos que também não ajudam seu filho a crescer de modo integral e íntegro.

Semana passada recebi a mãe de um paciente de 17 anos a qual me informou que iria mudar seu filho de escola novamente porque mais uma vez professores faziam “complô” contra ele, dando notas baixas e chamando sua atenção alegando comportamentos desafiadores e inadequados. Ainda segundo ela, seu filho era brilhante, um QI altíssimo e que a escola não estava compreendendo o gênio que iriam perder.

Será que esta mãe estava sendo tolerante em perceber que seu filho não é perfeito e que talvez a educação que dá a ele também pode não ser? Será que 3 escolas estavam tão erradas, ao chamar a atenção de seu filho, ao exigir que se comporte de forma condizente como um aluno de ensino médio, que tem responsabilidades específicas, treinos necessários para o aprendizado, regras e disciplina?

O que tenho percebido cada vez mais, não apenas no consultório, mas nas ruas, no clube, nas escolas, são adultos intolerantes, adultos acusando outros, sem olhar para sua própria fragilidade. Adultos que regridem, que passam a ser contra-exemplos daquilo que pregam e almejam.  Você pode até não se encaixar nem perto de um do exemplo acima, mas consegue olhar de frente para seu comportamento de pai ou mãe no quesito paciência e tolerância? Lembro aqui que paciência e resiliência são competências que demandam atitude, tolerância, coerência e esforço. Autorreflexão, autocontrole e autocrítica são exemplos educativos valiosíssimos. Estão dispostos a este desafio?

A tolerância a frustração exercita várias áreas cerebrais, desenvolve recursos e potenciais criativos, empáticos e perseverantes. A criança que aprende desde cedo que não temos tudo que queremos na hora que desejamos e que para conquistar algo é preciso primeiro se esforçar para talvez receber a recompensa, fortalece sua autoestima, não fica tão subjugada ao outro ou às situações e é mais competente em se autorregular, ou seja, diante uma situação difícil tem mais estratégias para se superar e modificar a situação em prol do maior bem-estar.

Precisamos respeitar o tempo para educar. Não é num clic, nem criticando somente outros atores e espaços-tempos educacionais, mas assumir sua parte e trazer à consciência.

É “parir” é mais fácil, criar, corrigir, gerar bons modelos é mais difícil. Mas vale a pena. Frustração não é palavrão, pode ser estratégia, faz parte da arte para a educação dos jovens.

 

Artigo baseado no livro Frustração, editora Benvirá, da mesma autora do artigo.