Por Adriana Fóz

 

Atualmente é notório a necessidade de nos atentarmos para os aspectos da saúde mental infantojuvenil. Por um lado a preocupação dos pais, a negligência ou superproteção de outros;  os problemas de comportamento, os desafios vivenciados pelas escolas e o sofrimento.

O mundo está mudando mais rápido do que nossos cérebros estão acostumados a processar. Enquanto seres humanos temos um processo inerente de maturação de funções e áreas cerebrais que amadurecem em parte com o passar do tempo, em parte pelos estímulos do ambiente.

A criança tem períodos sensíveis para o aprendizado os quais precisam ser estimulados e treinados. Habilidades como controle dos impulsos e tolerância às frustrações são importantíssimas para o amadurecimento de áreas cerebrais, tal como o pré-frontal, que é a ultima região a ser desenvolvida e tem um papel crucial para a tomada de decisões, atenção dividida e autocontrole emocional, por exemplo. Aquelas necessitam de oportunidades para desenvolver recursos de autoconhecimento, autogestão e controle de seus impulsos.

É vivenciando experiências e tolerando as inevitáveis frustrações que estes cérebros serão capazes de se fortalecerem e tornarem sujeitos autônomos, resilientes e pacientes. Treinar competências emocionais para esperar sua vez para falar, para esperarem a hora de comer um doce, para terminar uma atividade que iniciou, para fazer uma tarefa necessária, porém não tão interessantes aos mesmos. Dizer um “não” com amor e responsabilidade, exigir comportamentos empáticos, gentis e perseverantes, oportunizar experiências ricas e coerentes de aprendizado são muito relevantes para o treino de habilidades e desenvolvimento de competências necessárias na escola e na vida.

Ao contrário do que alguns podem pensar, a frustração é um estado emocional genuinamente humano e não um sentimento de fracos. Aliás, pelo contrário, vivenciar frustrações pode fazer o jovem mais forte e capaz. A frustração como mecanismo cerebral precisa ser mais estudada, uma vez que muito de suas redes neurais estão sendo ainda pesquisadas e reconhecidas. Porém, fato é que se trata de um mecanismo neurocognitivo inerente aos seres humanos. Talvez o circuito neural da frustração tenha sido criado para os homens irem atrás de seus objetivos e desejos. Isso porque se o individuo ficasse sempre satisfeito, não sentisse o desprazer, o incômodo, talvez não fosse se mobilizar para procurar o novo, se esforçar para alcançar metas e outras necessidades em prol da evolução. Mas deixaremos as causas para etologistas e neurocientistas. Aqui vamos tratar do porque recentemente as crianças ditas digitais têm tanta dificuldade em acatar limites, modificar comportamentos e tolerar frustrações. A professora de psicologia da UFPR, Lídia Weber discorreu sobre a relação dos pais com a imposição de regras as crianças alegando que ”cerca de 35% deles é negligente, ou seja, não impõe regras, nem dá afeto, e são essas as crianças que vão ‘dar problema’”, explica a professora e pesquisadora na área.

Se perguntar para um pai ou uma mãe: Você quer que seu filho se torne maduro, autônomo e independente? Quer ainda que seja automotivado, feliz e satisfeito com sua vida? Se a resposta for sim, não haverá outro jeito para alcançar seus objetivos paternais e maternais, do que ajudá-lo a superar frustrações. Desde já afirmo que ajudar não é fazer por, comprar o objeto de desejo ou terceirizar responsabilidades. Uma criança que é o centro das atenções de um lar, que pode tudo o que quer ou que tem sempre um dos pais a protegê-la de seus erros, ataca quem o critica ou a seu filho e sofre mais do que seu próprio filho pelos seus irremediáveis desacertos e esforços, tem muita chance de não alcançar o desejo acima colocado.

Nunca tivemos tantas crianças medicadas, tantos adolescentes deprimidos – inclusive os que chegam até o suicídio – e tantos jovens adultos infelizes. O que os pais e adultos não estão compreendendo? O que não conseguem ver? Sim, é a nossa geração adulta que está criando seus filhos delegando tarefas de diversão, uso do tempo, e condição de afeto, inconscientemente ou não, para tablets, celulares, produtos de satisfações imediatistas e desejos efêmeros. Sim, são os pais das atuais crianças e adolescentes que estão  grudados em seus smathphones, que acompanham a vida de outros “amigos”, que curtem o tempo todo o que pode ser apenas fake. Porém o não é fake, mas fato é que seus filhos são de verdade e crescem, desenvolvem e amadurecem seus cérebros, organismos os quais ainda não estão prontos para o discernimento, para tamanha responsabilidade que é o que vou fazer com meu presente. Sim, não falo do presente em dólar ou em reais, mas do presente do hoje, do tempo que uma vez perdido não volta nunca mais. Isto não será frustração, isso é arrependimento, culpa, ou outros sentimentos que também não ajudam seu filho a crescer de modo integral e íntegro.

Semana passada recebi a mãe de um paciente de 17 anos a qual me informou que iria mudar seu filho de escola novamente porque mais uma vez professores faziam “complô” contra ele, dando notas baixas e chamando sua atenção alegando comportamentos desafiadores e inadequados. Ainda segundo ela, seu filho era brilhante, um QI altíssimo e que a escola não estava compreendendo o gênio que iriam perder.

Será que esta mãe estava sendo tolerante em perceber que seu filho não é perfeito e que talvez a educação que dá a ele também pode não ser? Será que 3 escolas estavam tão erradas, ao chamar a atenção de seu filho, ao exigir que se comporte de forma condizente como um aluno de ensino médio, que tem responsabilidades específicas, treinos necessários para o aprendizado, regras e disciplina?

O que tenho percebido cada vez mais, não apenas no consultório, mas nas ruas, no clube, nas escolas, são adultos intolerantes, adultos acusando outros, sem olhar para sua própria fragilidade. Adultos que regridem, que passam a ser contra-exemplos daquilo que pregam e almejam.  Você pode até não se encaixar nem perto de um do exemplo acima, mas consegue olhar de frente para seu comportamento de pai ou mãe no quesito paciência e tolerância? Lembro aqui que paciência e resiliência são competências que demandam atitude, tolerância, coerência e esforço. Autorreflexão, autocontrole e autocrítica são exemplos educativos valiosíssimos. Estão dispostos a este desafio?

A tolerância a frustração exercita várias áreas cerebrais, desenvolve recursos e potenciais criativos, empáticos e perseverantes. A criança que aprende desde cedo que não temos tudo que queremos na hora que desejamos e que para conquistar algo é preciso primeiro se esforçar para talvez receber a recompensa, fortalece sua autoestima, não fica tão subjugada ao outro ou às situações e é mais competente em se autorregular, ou seja, diante uma situação difícil tem mais estratégias para se superar e modificar a situação em prol do maior bem-estar.

Precisamos respeitar o tempo para educar. Não é num clic, nem criticando somente outros atores e espaços-tempos educacionais, mas assumir sua parte e trazer à consciência.

É “parir” é mais fácil, criar, corrigir, gerar bons modelos é mais difícil. Mas vale a pena. Frustração não é palavrão, pode ser estratégia, faz parte da arte para a educação dos jovens.

 

Artigo baseado no livro Frustração, editora Benvirá, da mesma autora do artigo.