A Saúde Mental dos Professores, obrigados a se reinventar

A Saúde Mental dos Professores, obrigados a se reinventar

Especialistas analisam principais problemas que afetam os professores em seu dia e dão dicas para a saúde mental

Lidar melhor com a ansiedade, o estresse e as emoções desagradáveis (também chamadas comumente de “negativas).

Considerado um dos principais desafios que envolvem a saúde mental do professor, já que a atividade docente é uma das profissões que mais exigem trabalho mental.

Se não forem bem manejados, estes fatores podem gerar grande desgaste que repercutem sobre a saúde física e emocional e, assim, afetam significativamente o desempenho profissional.

Nessa perspectiva, vamos abordar a importância de promover a saúde mental dos professores e mostrar como reduzir os impactos do distanciamento social causado pela pandemia de coronavírus na rotina diária. Confira, ainda, dicas da dra. Luciana Mancini Bari, médica do Hospital Santa Mônica e de Alcione Marques, psicopedagoga da NeuroConecte, para a promoção da saúde mental nesse grupo e a importância de buscar ajuda quando necessário. Aproveite a leitura!

A importância da promoção da saúde mental de professores

Uma recente pesquisa sobre o impacto do sofrimento mental dos professores que atuam no ensino público no Paraná destacou a relevância do cuidado com a saúde emocional desses profissionais. O resultado da amostra com 1021 professores revelou os seguintes dados:

  • ansiedade em 70%;
  • distúrbios psíquicos em 75%;
  • depressão em 44% dos entrevistados.

Esses índices demonstram a necessidade urgente de buscar formas de reduzir os efeitos da quarentena na rotina diária desses profissionais. A substituição da modalidade de aulas presenciais pela online elevou a carga de trabalho, aumentou a ansiedade e o estresse e gerou todo tipo de desgastes nesse grupo.

Na verdade, ninguém estava preparado para as mudanças impostas pela pandemia e, para os profissionais da educação, isso teve um peso ainda maior. Fatores como cobranças administrativas e a falta de preparação para essas transformações geraram graves problemas à saúde física e mental dos educadores.

Mediante a urgente necessidade de se reinventar, muitos professores tiveram a saúde emocional abalada pelos desafios impostos por esse cenário. Muitas são as demandas que exigem a rápida adaptação deles a essas situações. Além disso, o ritmo do trabalho virtual pode ser muito mais intenso do que nas aulas convencionais.

Logo, a adaptação forçada ao “novo normal”, a extensa rotina online, o medo da contaminação pela doença, o medo de muitos de perderem seus empregos e a necessidade de manter o isolamento resultaram em grandes impactos psicológicos nesses profissionais. Por isso, a atenção à promoção da saúde mental dos educadores não pode ser negligenciada.

Saúde mental dos professores na quarentena

Promover a saúde mental do professor se tornou ainda mais necessário para superar os desafios impostos pelas aulas digitais. Um estudo publicado pelo Scielo alertou sobre a importância de prevenir o adoecimento mental nesse grupo, dada a complexidade que envolve o trabalho docente nesse contexto de pandemia.

saúde mental desses profissionais durante a quarentena é um tema de extrema relevância, já que muitos estão ficando exaustos, já que o novo contexto exige que se aprenda novas habilidades em um curto espaço de tempo, o que por si só é cansativo.

Além disso, o trabalho em casa, muitas vezes tendo de conciliar com as rotinas domésticas e necessidades da família geram uma grande sobrecarga. Na maioria das vezes, não há um suporte adequado por parte da direção da escola. Por essa razão, muitos docentes se sentem impotentes diante dos desafios que não conseguem enfrentar sozinhos.

Alguns profissionais — como pedagogos e psicólogos — que poderiam apoiar os docentes nesse momento nem sempre estão presentes. Por conseguinte, os professores estão cada vez mais expostos aos altos níveis de estresse decorrentes do cenário atual da educação que podem levar a transtornos mentais.

Entre os maiores fatores que afetam a saúde mental dos professores, destacam-se:

  • desvalorização social do trabalho;
  • classes virtuais muito numerosas;
  • falta de preparo para lidar com as tecnologias de ensino à distância;
  • falta de técnicas pedagógicas para o ensino on-line;
  • falta de apoio da gestão escolar;
  • relações interpessoais insatisfatórias;
  • turmas desinteressadas pelo aprendizado;
  • desânimo e desmotivação para o trabalho;
  • inexistência de tempo para um adequado descanso;
  • cobranças e exigências de qualificação do desempenho.

Dicas para promover a saúde mental do professor

Um ensaio sobre Liderança Educacional, publicado pela Universidade de Harvard (EUA), abordou a importância de proteger a saúde mental dos professores. Segundo os pesquisadores, os docentes percebem a necessidade de promover o bem-estar de seus alunos, mas nem sempre se dão conta da relevância de cuidar da própria saúde mental.

Tendo isso em vista, elencamos algumas práticas para melhorar a condição emocional do professor. Confira!

  1. Organize sua rotina

    Engana-se, quem pensa que dar aula em casa é uma tarefa fácil. Além da necessidade de mais tempo para pesquisar, planejar e elaborar as videoaulas ou podcasts, ainda há o risco de imprevistos que podem surgir durante o dia. Portanto, organizar melhor a rotina e estabelecer um cronograma com as atividades diárias é crucial.

2. Pratique atividade física

Além de fortalecer o organismo contra diversos tipos de doenças, inclusive a Covid-19, os exercícios físicos ajudam a relaxar a mente e promover o bem-estar emocional. Tais práticas se tornam imprescindíveis à diminuição do estresse e ao controle dos pensamentos negativos que comprometem a saúde mental do professor.

3. Desconecte-se

Entre as formas de preservar o auto-cuidado, o controle do uso de dispositivos eletrônicos é um dos mais relevantes. Como o cenário atual trouxe a necessidade do uso constante da tecnologia para o trabalho, os professores precisam buscar um ponto de equilíbrio em suas tarefas diárias.

O ideal é alternar a elaboração das videoaulas com atividades relaxantes, como ioga, caminhada e práticas de instrumentos musicais. Adotar essas medidas ajuda a relaxar o cérebro, além de movimentar o corpo para evitar os danos decorrentes da postura durante o trabalho online.

4. Melhore as relações com os colegas

É fundamental que o corpo docente cumpra as metas estabelecidas pela escola, mas o papel do diretor e dos demais auxiliares é fundamental na organização da demanda.

Melhorar as relações com os colegas e manter uma comunicação eficaz pode diminuir a pressão e as cobranças resultantes da sobrecarga de trabalho.

5. A importância de buscar ajuda

Diante de tudo isso que apresentamos, é preciso buscar maneiras mais adequadas para lidar com a questão emocional dos educadores em tempos de pandemia. Por isso, para garantir uma saúde mental dos professores mais equilibrada, a ajuda profissional é indispensável.

Nessas circunstâncias, somente uma equipe de especialistas está apta a auxiliar os docentes na superação dos riscos associados à rotina escolar.

Um suporte adequado é essencial para o enfrentamento das questões resultantes dessa rápida transformação do contexto educacional.

Como vimos, diversas questões podem prejudicar a saúde mental do professor e comprometer a qualidade do ensino. Logo, a ajuda de uma instituição especializada em saúde mental não pode ser negligenciadas.

FONTE: https://www.vidaeacao.com.br/saude-mental-dos-professores/

Aprendizado por projetos se consolida nas escolas

Aprendizado por projetos se consolida nas escolas

Cada vez mais instituições de ensino incorporam o método com o objetivo de desenvolver estudante de maneira integral

Luciana Alvarez, especial para o Estadão
Com a promessa de desenvolver os alunos de maneira integral – e não apenas o lado cognitivo -, cada vez mais colégios passaram a incluir em currículos o trabalho por projetos. Embora estejam quase onipresentes nas escolas atualmente, tanto particulares como públicas, há formas muito variadas de serem aplicados e pesos bem diferentes na proposta pedagógica.
Na Escola Concept, o ensino é exclusivamente por projeto. Conteúdos, habilidades e competências a serem desenvolvidos a cada ano são reunidos dentro de alguns; em geral, são dois ou três a cada trimestre. Priscila Torres, diretora da unidade paulista, explica que todos os parâmetros e os objetivos são articulados em uma proposta de interesse dos alunos. Para o 3.º ano do fundamental, por exemplo, é esperado que aprendam em Ciências com a diferença entre animais terrestres e aquáticos; em Matemática, estimativa de massa; em Linguagens, as mídias digitais. “Eles queriam entender por que os ambientes naturais pareciam mais saudáveis na pandemia. A partir disso, construímos um telejornal.”

Na proposta que a escola adota, os alunos são avaliados individualmente (cada um apresentou uma notícia) e coletivamente (fizeram um site reunindo tudo o que aprenderam na atividade). Apesar de todo o processo ser via projetos, há exames. “A gente tem autoavaliação, avaliação continuada e prova. Essa variedade é importante para entender onde estão as lacunas.”

Mescla. O mais comum, contudo, é que as escolas usem projetos concomitantemente a aulas por disciplinas e, nessas atividades, as “notas” sejam na verdade rubricas de aprendizados, classificando os alunos por grau de proficiência. “Quando se fala em aprendizagem por projetos, você sai do contexto de erro e acerto. Mas a escola tem de pensar em como conseguir evidências de que há aprendizado e dar um feedback ao longo do processo. A avaliação tem de acompanhar o percurso”, diz Bernard Caffé, fundador da plataforma de educação Jovens Gênios.

Faz dois anos que a rede Poliedro passou a incluir projetos na grade do médio – antes havia só atividades extras. “Nosso modelo já contempla o novo ensino médio da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), com itinerários. Tem uma formação básica, igual para todos, e um modelo em que o aluno trabalha com conhecimentos específicos, que escolhe conforme suas afinidades. É aí que entram os projetos”, diz Andrea Godinho de Carvalho Lauro, coordenadora do médio do Poliedro. A instituição não abre mão de uma forte preparação para vestibular, e Andrea defende que os projetos contribuem. “As habilidades não são apartadas do conhecimento. Não há mais espaço para desenvolver o conteúdo sem a ligação com as competências socioemocionais.”

Se em teoria projetos despertam o interesse de aprender, na prática o modelo pode não ser o melhor para todos. “Entendo a importância, mas prefiro fazer provas”, diz Vitório Armani de Lacerda Lima, no 2.º ano do médio do Poliedro. “Quero Engenharia no ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), preciso me preparar. Por isso acho que a escola tem de dar mais ênfase a provas mesmo. Em um projeto, a gente pensa na eficiência e divide as tarefas com cada um no que tem qualidade. Para a prova, tenho de me forçar no que não sei tão bem”, pondera.

Experiência. Apesar de ter ganhado relevância nos últimos anos, o ensino por projetos é tradicional em alguns colégios da capital paulista, como o Gracinha, que na década de 1990 já era uma referência no tema. “Projeto traz uma abordagem multidisciplinar, que permite mais interação. Mas nem tudo cabe em um projeto. Temos momentos de aula expositiva, de aula invertida”, afirma Ligia Mori, diretora pedagógica da escola.

Gizele Gasparri, professora de Ciências no Colégio Albert Sabin e na rede estadual, propõe projetos para suas turmas há mais de 20 anos. “Até hoje me emociono de lembrar de um de 2006 sobre correntes elétricas com uma turma da rede pública, quase todo com sucata.”

A neuropsicóloga Adriana Fóz, autora do livro A Cura do Cérebro, garante que pode ser um método eficaz, mas lembra que só fazer um projeto não basta. “A escola precisa checar a aprendizagem e o aluno ter consciência do que aprendeu. Para muitos, esses aspectos ainda têm de ser incorporados.” Ela diz que, por provas ou projetos, os alunos precisam ser exigidos. “Se trabalha só de jeito prazeroso, a educação fica falha. A cobrança cuidada é uma estimulação necessária. O cérebro tende à homeostase. Se lhe for permitido, vai só na sombra e água fresca.”

No Equipe, a função dos projetos é tirar o alunos da zona de conforto. “No 2.º ano do médio, estudam a agroindústria. Antes da pandemia, eles iam a Ribeirão Preto visitar uma usina de cana, conversar com trabalhador rural, com responsável por indústria de alimentos, iam a acampamento de sem-terra. Isso envolve todas as disciplinas: inclui de Geografia a Química, de Filosofia a Biologia”, diz Luciana Fevorini, diretora da instituição.

Fonte: https://www.terra.com.br/noticias/educacao/aprendizado-por-projetos-se-consolida-nas-escolas,3a31eeb06495122227eb5d022f9c29b2dj18sc17.html

Felicidade & frustrações

Felicidade & frustrações

por Adriana Fóz

 

Frustração, quem nunca? Por sermos humanos, invariavelmente passaremos por frustrações, para crescer, fortalecer e promover a autoestima. Alguns passam tão rápido por este estado emocional que não se incomodam e outros podem ficar atolados como em uma areia movediça.

Este fenômeno cerebral também vai depender do temperamento, personalidade e experiências prévias.

Você já reparou que é mais fácil assumirmos que vivemos ansiedades do que frustrações?

Mas por quê?

Uma das principais razões é pela falta de conhecimento sobre o tema.

Por exemplo, ansiedade já está na “boca do povo”. Encontramos o termo em muitos artigos, livros, debates, falas espontâneas, etc. Hoje em dia as pessoas não se sentem mais intimidadas por assumirem que estão passando por crises de ansiedade, até por ataques de pânico, porém, não foi sempre assim. No entanto, ainda não vemos o mesmo acontecer com o estado emocional da frustração. Raramente ouvimos alguém comentar o quanto se sente frustrado, o quanto está difícil tolerar sua frustração, seja amorosa, com o trabalho, filhos ou outros temas. Portanto, falar sobre o assunto, procurar informações competentes e matérias de fontes sérias, sem fake news, é imprescindível e libertador.

Conhecer sobre o tema também conhecido como sentimento, pode trazer estratégias e recursos para lidar melhor e  superar esta sensação tão desagradável e muitas vezes, incapacitante.

É interessante notar que estes mecanismos cerebrais são frutos de anos de epigenética e ontogênese, ou seja, têm sua razão de fazerem parte de nossos processos neurais e consequentemente, comportamentais frutos da relação entre a natureza e o ambiente.

Creio que poderá concordar com meu entendimento e com o que muitos artigos também indicam: o ser humano tem uma tendência a se acomodar, a por exemplo, escolher deitar numa rede sob a sombra de um coqueiro tomando água de coco, à sair em busca de trabalho. Então criar redes neurais que precisam de processos específicos para alcançar a satisfação pode ter sido uma das grandes sacadas na motivação da espécie humana. Por sua vez, necessitar do esforço para produzir neurotransmissores resultando em prazer é uma estratégia louvável para a sobrevivência dos cérebros e consequente da vida humana.

Ainda de acordo com a neurociência,  tem-se muito a pesquisar e descobrir sobre os circuitos da frustração. Correlacionada ao sistema de recompensas do cérebro, uma vez que o sentimento/estado emocional acontece quando há bloqueio da conquista ou satisfação, o que gera automaticamente uma alteração química levando à sensação desconfortável. A omissão ou falta da recompensa acarreta um encadeamento de mudanças no comportamento e aprendizado, potencializando processos dos neurônios  dopaminérgicos1, além de um efeito emocional no próprio sujeito. A consciência e modulação da expectativa funciona como um termômetro da frustração, onde quanto maior é a expectativa, maior poderá ser a chance de se frustrar.

Interessante notar que pessoas diferem em relação a tolerância à frustração. O tipo de temperamento, por exemplo, pode afetar o padrão de ativação do seu circuito ou redes neurais. O termo temperamento refere-se a características individuais que supostamente têm base biológica ou genética e que determinam as reações afetivas, motoras e de atenção em variadas situações.

Há cerca de 2500 anos, Hipócrates, considerado o pai da Medicina, classificou o temperamento da espécie humana em quatro tipos básicos: Sanguíneo, típico de pessoas mais ativas, cujo humor varia com certa frequência; Melancólico, característico de pessoas mais tristonhas, “ruminativas” e sonhadoras; Colérico, peculiar de pessoas cujo humor se caracteriza por  desejos fortes e sentimentos impulsivos, representado pela bile; Fleumático, encontrado em pessoas mais lentas e apáticas, o que se chamava ter sangue frio. Depois de Hipócrates muitos estudos vieram, mas o coração do conhecimento sobre temperamentos vem deste sábio.

Várias pesquisas foram desenvolvidas desde então e pontuo aqui uma com base nos neurotransmissores, nos processos genéticos, bioquímicos e nervosos, na qual creditando ao cérebro, a explicação para as diferenças de temperamento (ZUCKERMAN, 1991)

No entanto, é importante lembrar que temperamento não é destino. Segundo Trembley e colaboradores5, mesmo que tenham base em processos genéticos e outros processos biológicos, os traços temperamentais são moldados por uma combinação de fatores genéticos e ambientais, tanto no início do desenvolvimento quanto nos anos da infância.

Além do temperamento, também o estresse pode estar intimamente relacionado com o estado frustrante. Em uma pesquisa2, durante a execução de uma tarefa perceptiva bem treinada (leitura em braile), esta mostrou não prejudicar o nível de precisão, mas isso ocorreu a um custo de aumento da ativação cerebral, englobando os gânglios da base, juntamente com a ínsula e os córtices somatossensoriais. As diferenças de temperamento e os níveis de estresse desempenharam um papel significativo no enfrentamento da situação.

Indivíduos com baixa tolerância apresentaram maior ativação no giro cingulado posterior, precuneus e lobo parietal inferior do que no grupo de alta reatividade, segundo a pesquisa de Maria Bierzynska2 e colaboradores.

Nosso corpo e cérebro processam, percebem e lidam com os estados emocionais da ansiedade, que geralmente é correlacionada a eventos futuros, e os estados emocionais da frustração, correlacionada aos eventos do passado.  Ambos estados podem ser muito positivos ou muito nocivos à nossa qualidade de vida. Contudo, a despeito de cuidar dos níveis do estresse, investir no autoconhecimento e nas estratégias de manejo da frustração para a sua saúde e de seus pares é salutar.

Sêneca (4 a.C. — 65 d.C.), filósofo romano da antiguidade, nos faz lembrar sempre da inquietude, talvez quem sabe, dos humores que o levaram a um final de vida tão trágica. Ele pontuava que para não se frustrar era importante focar no que depende de você e ter paciência frente aquilo que foge ao nosso controle. Escreveu vários textos tratando de como manejar e lidar com  fracasso para alcançar o sucesso, que ele mesmo perdeu a “fórmula” . A vida deste filósofo foi longa, difícil e com um final trágico. “Político promissor, interrompeu a carreira aos 20 anos por causa de uma tuberculose. Ao se recuperar, foi condenado ao exílio. Estava lá quando um terremoto destruiu Pompeia e um incêndio botou Roma abaixo. Acabou sendo eleito o instrutor do imperador Nero, apenas para ser condenado à morte por seu discípulo — foi orientado a cortar as próprias veias do braço, sob acusação de participar de uma conspiração. Não funcionou. Sêneca, então, tomou veneno. Também não foi eficiente”, resumiu muito bem Thiago Cordeiro. Morreu de desidratação, após se internar em uma casa de aguas quentes, ou o que hoje conhecemos como um local que tem saunas. Mas por incrível que pareça o filósofo não era infeliz ou amargurado, pois sabia que para se sair bem, alcançar sucesso era preciso aprender a lidar com as dificuldades, com os empecilhos inerentes a vida6.

E a felicidade? Seria a ausência de frustrações, dentre outras características? Ou ainda, seria a felicidade o oposto do sentimento frustrante? Será que Sêneca não foi feliz?

Pasmem. A ausência é que traz felicidade. Pode reparar, valorizamos quando não temos ou quando podemos não ter. Logo precisamos não conseguir algo para valorizar quando temos algo. Que incrível este tal de cérebro humano, concorda?

E ser feliz? É um estado passageiro, assim como o desabrochar de uma flor, que no nascimento da planta tem a ideia do florescimento como potencial e que viverá este momento de plenitude em algumas e pontuais situações ao longo da existência.

Assisti recentemente uma palestra do filósofo Mario Sérgio Cortella cujo título era: Felicidade. Segundo ele, quem é feliz o tempo todo é tonto. Não dá para sermos plenos o tempo todo, pois invariavelmente experimentamos falhas e faltas.

Somos seres vulneráveis, frágeis. Somos humanos.

Carlos Drumond de Andrade também deixou seu entendimento, “Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade. Ter motivos, se arriscar, tentar, a despeito do risco de frustrar-se é compreender que o medo, a frustração podem coexistir com a coragem. Basta buscar perceber, identificar e lidar. Basta treinar.

Poder assumir que está frustrado com uma situação, pessoa ou consigo mesmo, desenvolver recursos, forças pessoais- além de buscar compreender a frustração do outro-, são sinais do processo de crescimento, fortalecimento e superação. E por que não, estratégias para a conquista de felicidades?

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

  1. 1.ABLER,B., WALTER,H. & ERK.S Neural Correlates of Frustration. NeuroReport,16(7), p.666-72,2005
  2. BIERZYNSKA M E COLS Efect of frustration on Brain Activation Pattern in Subjectcts with Different Temperament. Front Psychol.2015;6 Published online 2016 Jan 11

 

PARA SABER MAIS:

(ZUCKERMAN, 1991)

 

  • Sêneca,LA. Sobre a brevidade da vida. L&PM Pocket Plus,2006.

 

Precisamos falar sobre saúde mental nas escolas

Precisamos falar sobre saúde mental nas escolas

No Setembro Amarelo, mês voltado para campanhas relacionadas à prevenção ao suicídio, conheça cinco serviços que podem auxiliar estudantes e educadores a lidar com o tema

10 de setembro de 2020

 

Todos os anos, no mês de setembro, campanhas ao redor do mundo chamam atenção para a importância da prevenção ao suicídio.  Em 2020, a população global se vê diante de mais uma crise de saúde pública: a pandemia de coronavírus. Com escolas fechadas, economia abalada e o isolamento social como principal medida de precaução, cuidar da saúde mental é tão central quanto combater o novo vírus.

Segundo dados recolhidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2016, uma pessoa comete suicídio a cada quarenta segundos, o que significa um total de 800 mil mortes por ano. A maior parte dessas pessoas tem entre 15 e 24 anos, traduzindo um cenário ainda mais preocupante para os jovens.

“O suicídio não é um fenômeno de causa única. É importante termos em mente que esses fatores não estão somente relacionados ao indivíduo e suas questões familiares ou transtornos mentais, eles estão diretamente conectados com o contexto social e coletivo”, explica Alcione Marques, psicopedagoga e diretora da NeuroConecte, consultoria de aprendizagem emocional e neurociência educacional.

A exposição à violência, ao álcool e as drogas, problemas familiares, desigualdade social e até mesmo os processos de afastamento do coletivo, que tornam mais frequentes os sentimentos de ansiedade e depressão, são parte dos multifatores que podem induzir ao suicídio.

Por outro lado, a OMS afirma que 90% dos casos podem ser evitados a partir de políticas públicas e estratégias voltadas para a saúde mental em diversas esferas da sociedade.

O papel da escola na prevenção do suicídio

Embora o diagnóstico e o tratamento estejam relacionados à área da saúde, a sociedade como um todo tem a responsabilidade de promover um ambiente adequado para o desenvolvimento saudável. Partindo dessa perspectiva, a escola ocupa um papel fundamental por ser um espaço de construção do coletivo e repertório cultural.

“Hoje nós lidamos com um contexto muito mais amplo de sociedade, que nos traz mais oportunidades de conexão e acesso à informação, ao mesmo tempo em que demanda competências para lidar com tamanha complexidade”, defende Alcione. “Por isso a importância de pensar em processos estruturados que trabalhem as habilidades socioemocionais na escola, passam a ser recursos valiosos para entender o mundo em que vivemos”.

Na opinião da especialista, da mesma forma que se estuda os sistemas imunológico, digestivo, circulatório, é preciso aprofundar também o entendimento do cérebro, das emoções e como elas afetam o desempenho de atividades básicas. Quebrar o tabu e trazer temas como transtornos mentais e saúde emocional é o primeiro passo para a prevenção.

“Grande parcela dos suicídios está diretamente relacionada à saúde mental. Se o jovem encontra um espaço de acolhimento e aprende a lidar com a frustração, a ansiedade e o estresse, entende as próprias emoções e as do outro, isso diminui os fatores que podem levar ao suicídio”, acrescenta Alcione.

A psicopedagoga reforça, ainda, que é importante cuidar da saúde mental dos educadores, bem como capacitá-los para saber reconhecer sinais e criar um ambiente de escuta e proteção para os estudantes.

Setembro Amarelo: Ampliando o debate

Ainda segundo o último relatório da OMS, no Brasil a taxa de suicídio a cada 100 mil habitantes cresceu 7%, em contrapartida ao índice global que caiu 9,8%. As estatísticas também mostram que países de baixa renda ou alta desigualdade social têm as maiores taxas de suicídio, podendo chegar a 11,5%. Somando isso à estimativa de que o suicídio é mais comum entre os jovens, cerca de ¼ da população economicamente ativa está em risco.

Para conscientizar a sociedade brasileira sobre a importância de combater essa crise de saúde pública, a campanha Setembro Amarelo acontece há cinco anos e foi criada em uma parceria entre o CVV (Centro de Valorização a Vida), o CFM (Conselho Federal de Medicina) e a ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).

Em 2020, o foco principal é a saúde mental durante a pandemia. A ideia é aproveitar que a procura por atendimentos psicológicos aumentou, sobretudo pela possibilidade de fazê-los online, e ampliar ainda mais o debate para incentivar o investimento em centros de atendimento psicossociais, investir na formação de profissionais da área de saúde mental e valorizar o autocuidado.

A psicopedagoga Alcione Marques volta a ressaltar a importância desse espaço de discussão.

“É importante rever nossas próprias concepções e também tomar cuidado para não limitarmos as ações de promoção de saúde e de qualidade de vida somente ao mês de setembro, elas devem ser permanentes ao longo do ano inteiro”, conclui.

 

 

A seguir, conheça alguns serviços gratuitos que podem auxiliar educadores e estudantes na prevenção do suicídio e na promoção da saúde mental.

Clínica Escola de Psicologia

Em todo o Brasil, diversas instituições de ensino vinculam-se a centros de atendimento públicos, dando aos estudantes da área da saúde a oportunidade de aprender na prática e ainda ajudar a comunidade. A Clínica Escola de Psicologia oferece serviços de tratamento e diagnóstico em várias frentes, para atender crianças, adolescentes, adultos, idosos e famílias. Geralmente, esse atendimento é gratuito e pode ser encontrado nas universidades e faculdades.

CVV Comunidade

Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma rede de apoio que tem como missão prevenir o suicídio, e atua em campanhas e ações voluntárias há 58 anos. O CVV Comunidade é um dos programas mantido pela rede e tem como objetivo principal aprofundar a conexão com famílias, escolas, organizações e outras instituições presencialmente. A ideia é promover atividades participativas para desenvolver o autoconhecimento e orientar o trabalho da saúde mental. Dentro dessa iniciativa são disponibilizadas ferramentas sociais para serem usadas em diversas frentes: grupo de apoio aos sobreviventes de suicídio (GASS), rodas para reflexão e troca de experiências (CRC), exibição de filmes que tratem da saúde mental (Cine-SER CVV), cursos de escuta ativa e valorização da vida. Saiba mais onde encontrar e como entrar em contato com o projeto na sua região!

Programa Viver com Saúde + Conviva SP

Conviva SP,Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, é um programa de apoio e acompanhamento das equipes docentes, com o objetivo de fortalecer a rede de proteção social no entorno da comunidade escolar e aproximar serviços de assistência e saúde mental. Já o Programa Viver com Saúde, desenvolvido pela Fundación Mapfre, ajuda a implementar ações para trabalhar saúde infantil, alimentação saudável e prática de atividades físicas. Após a pandemia, o projeto incluiu a saúde mental como um dos eixos principais e, em parceria com a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), desenvolveu uma formação voltada para o trabalho de temas como bullying, sinais de depressão, violência e emoções.

A Chave da Questão

A plataforma de consultas online A Chave da Questão, do Núcleo Convivências, disponibiliza publicamente psicólogos selecionados e autorizados para serem escolhidos pelos usuários de acordo com a linha de atuação, especialidade, tempo de exercício da profissão, entre outros critérios. O diferencial da iniciativa é que os atendimentos são feitos totalmente a distância e, durante a pandemia de COVID-19, estão oferecendo serviços de aconselhamento terapêutico online e de graça. Para ter acesso, basta realizar o cadastro na plataforma.

Mapa da Saúde Mental

O Mapa da Saúde Mental é um site que reúne serviços gratuitos voltados para o atendimento psicológico em diversas frentes: para públicos específicos, para a comunidade em geral, para profissionais da saúde, presencialmente e a distância. Na plataforma é possível encontrar informações sobre saúde mental, assistência e contatos de instituições que atuam em todas as regiões do Brasil.

 

Obs: Matéria publicada originalmente no site http://fundacaotelefonicavivo.org.br/educacao-do-seculo-xxi/precisamos-falar-sobre-saude-mental-nas-escolas/

A infância e o aprendizado do autocontrole e da frustração

A infância e o aprendizado do autocontrole e da frustração

Por Adriana Fóz

 

É possível ensinar uma criança a ser mais tolerante inclusive frente às inerentes frustrações que toda vida, vive?

Esta pergunta não tem origem nas frustrações de pais, pertencentes as gerações X (nascidos antes de 1980 e depois dos baby boomers) e Y (pessoas nascidas entre 1984 e 1996), os quais quiseram poupar “todo” sofrimento, dor, dificuldade de seus filhos por um lado e por outro queriam recompensar suas faltas por estarem trabalhando fora ou por não conviverem com seus filhos.

Esqueceram de pontos básicos que dizem respeito a felicidade e satisfação do indivíduo, ou seja, que é levando tombos que aprendemos a andar; não temos tudo que queremos porque dividimos o mundo com outros indivíduos; é experimentando emoções e sentimentos que podemos aprender a lidar melhor com os mesmos; receber um não diante a negação de um desejo imediatista pode fortalecer e treinar a criatividade, a paciência e outras competências emocionais.

E o aprendizado da tolerância à frustração depende das experiências citadas acima e muito mais. Aliás, nestes tempos em que a rapidez é sinônimo de eficiência, as palavras tolerância e paciência têm sido muito pouco praticadas em várias searas.  Basta prestarmos atenção à fila de carros de quem está buscando o filho no colégio; na espera da vez de ser atendido na secretaria escolar; na relação irritadiça com outro pai de aluno; na escuta da nota “vermelha” que o filho recebeu do professor por ter tido um desempenho abaixo do esperado, pois o mesmo não se empenhou, etc..

Treinar a tolerância assim como a paciência é preciso de bons exemplos e tem sido tema frequente de pesquisas que estudam sobre a competência escolar, profissional e sobre a qualidade de vida.

Bem antes de um bebê nascer, algumas estruturas e funções cerebrais já estão sendo formadas. Após o nascimento muitas outras transformações ocorrem nas sinapses, e mais, na arquitetura do cérebro. Potencializam-se e ampliam-se as relações entre os neurônios e correlatos por meio de processos maturacionais, do desenvolvimento mediante plasticidade neural, estimulações e das interações com o meio. A rotina, o afeto e oportunidades para aprendizados são como cimento e fiação da casa cerebral, a ser construída de forma firme, segura e potente.

As etapas do crescimento infantil não são lineares, tampouco, temos uma fórmula ou método milagroso para sua maior e melhor capacitação ou performance, mas sabemos que um dos aspectos fundamentais para o amadurecimento do cérebro e para a aprendizagem é o autocontrole. E aqui não me refiro a apenas o autocontrole físico, mas também o cognitivo e emocional, que claramente são interrelacionados entre si.

Desta forma, bebês que estão funcionando em termos sensoriais e motores vão aprender aspectos do controle de esfíncter, do choro, da marcha, dentre outros. Crianças mais velhas já terão um cérebro e corpo mais capazes de treinar e controlar sua vez na hora de falar, de fazer uma fila, de esperar a hora de comer, para interromper a atividade no iPad quando forem chamadas à mesa para fazer as refeições, por exemplo, e assim por diante. Entre 5 e 8 anos, os circuitos de controle de impulso têm um pico de desenvolvimento, ou melhor, estão no período bem sensível de conectividade neural.

Intervenções e métodos que exercitam o autocontrole têm tido muito bons resultados como os programas de aprendizagem socioemocional, que ensinam as crianças a se autorregularem.

Aliás, aproveito aqui a oportunidade para dizer sobre a importância deste aprendizado ser horizontalizado nas escolas e que faça parte de todas as disciplinas, sendo contemplado por todos os atores educacionais, principalmente os professores, senão podemos cair na falácia de algo que precisa ser vivenciado, introjetado e protagonizado, para ficar apenas no papel ou no texto digital, numa estratégia de marketing escolar, ou um item a cumprir de um currículo que só fala, mas não faz.

O autocontrole é resultado de treino, onde a família, a escola, a comunidade têm (devem ter) participação ativa e corresponsável. É uma qualidade autorreguladora que usamos para executar atividades tais como: brincar, pular, gritar, obedecer, estudar, nos relacionar com os outros, aprender sobre ciências da natureza ou jogar um jogo, exercitar um esporte, etc…

A intolerância desses novos tempos estão gerando jovens que não sabem esperar, que nada os satisfazem, querem sempre mais, se esforçam pouco e acreditam que fizeram muito, não valorizam esforços alheios, não terminam o que iniciam, se sentem empoderados sem ainda ter a legitimidade. Tornam-se frustrados e ainda não conseguem dispor de recursos de enfrentamento da realidade. Resultado disto: consultórios psiquiátricos lotados, fuga nas drogas, desinteresse pelo estudo, relacionamentos fugazes, e muito mais.

Por isso, durante minha apresentação no TEDx Plasticidade Emocional.1 da Sala São Paulo, mencionei que antes adoecíamos do corpo com doenças como a tuberculose, difteria e hoje adoecemos o cérebro, com a depressão e outras doenças cerebrais, as quais vêm se tornando cada vez mais prevalentes, no Brasil e no Mundo.

A tolerância a frustração treina circuitos cerebrais que nos tornam mais fortes e preparados. A intolerância nos enfraquece e ainda prediz caminhos patológicos em alguns cérebros. A psicopatia tem sido muito associada, dentre outros, a dificuldade cerebral para ser tolerante.

É cada vez mais comprovado que a plasticidade cerebral é uma característica de todo cérebro e que tem grande potencial durante a infância e adolescência. Então nesta época é maximizado o papel da aprendizagem para comportamentos, habilidades, desenvolvimento de competências, sempre levando em conta a singularidade do indivíduo.

Logo, compreender que recursos e habilidades como autocontrole, autoconhecimento, e outras em prol das competências socioemocionais é de suma relevância.

Precisamos oportunizar as crianças à experienciar algumas situações em que possam ser educadas, ensinadas em prol de sua vida acadêmica, social e pessoal. O exercício do autocontrole promove muitas das habilidades socioemocionais.

O autocontrole e a tolerância é como Romeu e Julieta, queijo com goiabada ou ainda, aplicativo e celular.

Agora, você pai ou mãe, ou especialista está ciente de seu papel e está ajudando, permitindo e promovendo que seu filho, aluno, cliente treine sua tolerância a frustração?

Segue um quiz, retirado do livro Frustração da editora Benvirá.2, de minha autoria, para que possa responder e refletir sobre alguns aspectos do aprendizado da tolerância às frustrações infantis.

Quer saber mais sobre o assunto? Entre em contato conosco!

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

  • TEDx Plasticidade Emocional –

https://www.youtube.com/watch?v=YLGSjLSEgo8

  • Fóz, A. Frustração. São Paulo: Benvirá, 2019.

 

PARA SABER MAIS:

  • MOFFITT, T. E. A Gradient of Childhood Self-Control Predicts Health, Wealth, and Public Safety. PNAS, 108 (7), p. 2693-8,2011.

 

  • GOLEMAN, D. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o que é ser inteligente, 2ª ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.
Neurociência da frustração em tempos digitais

Neurociência da frustração em tempos digitais

Por Adriana Fóz

 

Vivemos tempos digitais muito vulneráveis aos sentimentos frustrantes, às intolerâncias, ansiedades, e a internet tem estreita relação com os estados emocionais, tão desagradáveis. A queda de conexão, a lentidão da conexão wi-fi, etc., são fatores que vulnerabilizam os indivíduos ultimamente. As redes sociais também predispõem àqueles estados emocionais e acabam por encorajar pessoas com posições extremistas a se sentirem mais seguras e confiantes para expressá-las. Sem se importar com o outro, muitas pessoas que sentem impotência ou frustrações se comportam desta maneira, escondendo suas fraquezas e consciências. Colocam-se como se tivessem mais poder, e empoderadas, diminuem, ofendendo o outro.

A impotência, o sentimento de frustração e o não desenvolvimento de estratégias para lidar com tais situações, pois não fomos alfabetizados formalmente para se frustrar. Além, da necessidade que algumas pessoas têm de se impor sobre outras pessoas, levam a polarizações e extremismos em todo o mundo. Nas redes sociais isto se explicita cada vez mais e a psicóloga americana Pamela Rutledge1, diretora do Media Psychology Research Center (Centro de Pesquisas sobre Psicologia e Mídia), na Califórnia, faz importantes estudos sobre as redes sociais e o comportamento. Mas não é somente nas redes sociais que percebemos a intolerância e as polarizações, pois podemos testemunhar nas escolas, no relacionamento afetivo, no trânsito, no supermercado e assim por diante.

Portanto, nos dedicarmos ao tema da frustração é de grande valia para a saúde emocional e mental dos indivíduos. A frustração acontece quando não alcançamos objetivos, quando as expectativas são inatingidas, quando não realizamos desejos, sonhos ou projetos. É resultado de um processo cerebral que acontece para nos preparar para a realização de um ato, tem uma função “proativa” para o comportamento humano. Traz o incomodo que pode impulsionar uma ação.

Os estudos e pesquisas das neurociências têm avançado muito nos últimos anos, mas os conhecimentos das redes da frustração ainda engatinham. Apesar do incomodo da frustração ser tão antigo quanto sentir desejo, o aumento dos estudos de neuroimagem focados nesse estado emocional são mais recentes.

O circuito da raiva, já mais estabelecidos do ponto de vista das pesquisas robustas, é bastante similar ao da frustração, porém não é o mesmo. No entanto, a motivação e o sistema de recompensas do cérebro estão intimamente ligados ao circuito frustrante.

A neurociência já tem uma boa noção do que acontece quando estamos empolgados em buscar uma “recompensa”. Os circuitos de recompensa são bastante correlacionados ao neurotransmissor dopamina, que tem levado a fama de neurotransmissor do prazer, mas estudos recentes têm mostrado que atuam muito mais na motivação. O neurotransmissor dopamina inunda as vias neurais nos caminhos pela busca do desejo, caminhos que nos leva adiante. E não é exagero dizer que o motivo da busca do cérebro humano, é ser inundado por este bálsamo neural.

Segundo recente publicação do pesquisador Kyle E. Parker e colaboradores  o cérebro é um instrumento voltado para o equilíbrio e, de acordo com suas pesquisas, os mamíferos têm outro sistema que exerce uma força contrária sobre o aumento da recompensa, chamado sistema modulador da nocicepção (que também é a chave para a maneira como o cérebro modula a dor). Os neurônios deste sistema (apelidados de “neurônios de frustração”) emitem moléculas chamadas nociceptina que suprimem a dopamina. Logo, a nociceptina é anti-dopamina.

Os pesquisadores descobriram como isso funciona observando ratos à procura de açúcar escondido. Para obter o açúcar, eles tiveram que se esforçar, cutucar o focinho e lamber. Facilitaram, a princípio, para que tivessem motivação visando obter o açúcar, mas a cada tentativa eles passaram a dificultar um pouco mais o sucesso dos ratos. Depois de muito dificultar, os ratos cutucavam o focinho repetidamente e como ainda não conseguiam provar o doce, finalmente começaram a desistir. Eventualmente, todos eles pararam de tentar.

Enquanto isso acontecia, os pesquisadores rastreavam a atividade neural dos roedores e descobriram que os neurônios da nociceptina eram mais ativos quando os ratos desistiam. Mas vejam que interessante, esses neurônios ficam localizados perto da área tegmentar ventral do cérebro (ATV), o centro de atividades no sistema de recompensa! Por enquanto, o valor da descoberta poderia ser mais direto – simplesmente saber que “desistir” depois de se esforçar não é uma falha de caráter ou falha moral, é apenas outra maneira de o cérebro manter as coisas niveladas ou equilibradas.

A razão dessa interação entre aumento de recompensa e supressão de recompensa se resume à tendência do cérebro em direção à estabilidade e ao equilíbrio, conforme mencionado acima. É também conhecido como homeostase. Os cérebros dos mamíferos têm mecanismos inerentes para impedir que a busca por recompensas vá longe demais em qualquer direção. Na natureza, a continuação de um comportamento arriscado em busca de recompensas quando o sucesso está fora de alcance pode resultar em ferimentos ou morte, portanto, provavelmente herdamos esse ato de equilíbrio químico como um mecanismo de defesa, sobrevivência, uma estratégia altamente evoluída.

Imaginem a importância destes trabalhos! Distúrbios como depressão e dependência podem se desenvolver a partir desses sistemas regulatórios, ou de busca pela homeostase que não funcionariam bem por inúmeras razões.

“Podemos pensar em diferentes cenários onde as pessoas não são motivadas assim como a depressão e bloqueiam esses neurônios e receptores para ajudá-las a se sentirem melhor”, disse o autor sênior do estudo, Michael Bruchas2, cujo laboratório faz parte do  Washington University Pain Center, um centro multidisciplinar sediado no departamento de anestesiologia e psiquiatria, faz parte do EUREKA, um dos programas do National Institute of Health(NIH) .

Os pesquisadores pontuam que doenças neuropsiquiátricas que afetam a motivação podem ser melhoradas e que outros estudos em futuro recente podem esclarecer ainda mais esses e outros distúrbios, além de levar ao desenvolvimento de novas intervenções químicas para ajudar a restaurar o equilíbrio cerebral. É um ponto de luz para uma grande jornada, mas já é muito promissor, no meu entender.

Outro estudo bastante interessante que traz luz aos recém batizados neurônios da frustração- segundo o maior estudo com neuroimagem sobre frustração da atualidade-, é o do Rongjun Yu e colaboradores3, no qual verifica-se o circuito da frustração: amígdala, cinza periaqueductal (PAG), ínsula e córtex pré-frontal. Suas descobertas sugerem que a frustração pode ter uma função energizante. Como se a motivação que não aconteceu transforma-se em surtos (reações rápidas) agressivos, por meio de uma rede cortical, amígdala e PAG.

Ninguém gosta desta sensação e tampouco de não atingir objetivos ou alcançar expectativas, mas já que fazem parte da normalidade do cérebro humano, nos resta aprender mais sobre suas redes ou simplesmente treinar competências para superá-la4, concorda?

Quer saber mais sobre o assunto? Entre em contato conosco!

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

1- RUTLEDGE, P. ‘Impotentes e frustrados’ são os mais agressivos na internet, diz psicóloga. BBC News Brasil, 2015. https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150831_salasocial_agressividade_internet_rs acesso em: fev/20

2- BPARKER E., Kyle et al. A Paranigral VTA Nociceptin Circuit that Constrains Motivation for Reward. Cell.com,2019.

Crossref DOI link: https://doi.org/10.1016/J.CELL.2019.06.034. Acesso em: fev/20

3-YU,R e cols. The neural signature of escalating frustration in humans. sciencedirect.com, 2014. volume 54, 2014, pags 165-178. https://doi.org/10.1016/j.cortex.2014.02.013. Acesso em> fev/20

4- Fóz, A. Frustração. São Paulo: Benvirá, 2019.